MUITO ALÉM DE RODAS E MOTORES: A emoção e o pesadelo das corridas de rua

por Luiz Carlos Secco
O acidente recente ocorrido como o do Porsche nas ruas de São Paulo me fez lembrar dos tempos em que, por falta de autódromos, eram comuns corridas de automóveis por ruas de algumas cidades brasileiras. Apesar de serem emocionantes e empolgantes, motivaram em graves acidentes e momentos de horror até a sua suspensão.

Procedentes da Argentina, essas competições transformaram estradas e ruas em pistas de corrida. E influenciaram os brasileiros, desde as décadas de 1930 e 1940, a transformarem velhos automóveis em carros de competição, que ganharam o plágio de carreteras (estradas). Lembro que, em São Paulo, veículos semelhantes eram utilizados em pistas fechadas, mas no Sul do Brasil, as carreteras foram sempre muito admiradas e utilizadas.

Sem autódromos, até 1940, as corridas no Brasil tinham como palco algumas das principais cidades, como São Paulo, Rio de Janeiro e Porto Alegre. Entre as mais famosas, o Circuito da Gávea, conhecido como “Trampolim do Diabo”, que exibiu ao público os mais famosos pilotos do mundo, e o Grande Prêmio da Cidade de São Paulo, pelas ruas e avenidas da capital paulista, que em 1936, acabou ganhando o apelido de “Corrida da Morte” pelo acidente com a piloto francesa Hellé NIce, ocorrido na Avenida Brasil e resultou na morte de seis espectadores e mais de trinta feridos, provocando uma fortíssima compaixão no estado e em todo o País.

A corrida do Circuito da Gávea aconteceu anualmente entre 1933 e 1954, com um pequeno intervalo de 1942 a 1946, devido a Segunda Grande Guerra.

Pilotos estrangeiros e equipes internacionais se deslocavam ao Brasil para participar do evento, cuja magnitude era um fato: toda a cidade do Rio de Janeiro se via envolvida com o acontecimento, que no dia da prova chegava a atrair, de acordo com publicações da época, até 250 mil espectadores.

Ainda na fase inicial da instalação da indústria automobilística no Brasil, o entusiasmo coletivo levou as fábricas a prestigiarem as corridas, o que significou incentivar os jovens pilotos a competirem em ruas, por falta de autódromos, também em cidades do interior de São Paulo, onde, felizmente, não ocorreu nenhum acidente grave.
Imaginem a mescla de ingenuidade e entusiasmo dos executivos das empresas e dos dirigentes esportivos do passado. Não tinham a noção do perigo que representam as corridas em ruas e em estradas abertas. E acompanhavam, como eu, as corridas pelas ruas das cidades, sem pensar no perigo que representavam.

O fim das corridas de rua aconteceu no Rio de Janeiro, na cidade serrana da Petrópolis, onde dois jovens e promissores pilotos morreram em graves acidentes. O impacto daquele final de semana foi tão forte que nunca mais ouvi falar em corridas de rua.

A última corrida de estrada que acompanhei por leitura dos jornais e transmissão de emissoras de rádio foi a etapa de uma prova que marcou a inauguração da Rodovia Presidente Dutra, entre Rio de Janeiro e São Paulo, com vitória de Chico Landi ao volante de um Nash com o tempo de duas horas e 59 minutos.

Não há como prever o que um automóvel a mais de 200 km/h pode provocar em uma rua ou avenida. Isso já havia sido constatado há mais de 50 anos. Naquela época, os veículos não aceleravam como os de hoje, que atingem essa velocidade em menos de 10 segundos, e nem tinham os modernos equipamentos de segurança e proteção para os seus ocupantes, o que leva alguns motoristas a se arriscarem muito além da conta e colocarem em risco a sua vida e a de outros.

Infelizmente esses eficientes equipamentos protegem apenas que está nesses super carros e não quem, sem nada a ver com a atitude irresponsável, pode ser atingido e morto por esse verdadeiro foguete.

Sou motorista habilitado há 70 anos, viajei muito conduzindo automóveis, confesso que várias vezes abusei da velocidade, inclusive na companhia de minha mulher e de meus cinco filhos, mas tive a sorte de nunca ter sofrido um acidente grave.
Por sorte ou proteção divina, nada sofri e meus poucos acidentes resultaram apenas em perdas materiais.

Talvez por ter chegado à fase de idoso não sinto mais o desejo ou o ímpeto de conduzir meu carro além dos limites permitidos que, ainda reina para uma parcela de jovens motoristas. Estou mais preocupado com a economia de combustível e com a segurança que posso desfrutar.

Dirigir a mais 200 quilômetros por hora em uma estrada, avenida ou rua pode parecer mais emocionante do que competir num autódromo, mas representa riscos infinitamente maiores.

Minha recomendação, que segui ainda nos anos de 1960, é que existem alguns excelentes cursos de pilotagem à disposição dos aficionados, com a vantagem de, ao final, receberem um documento que os identifica como pilotos de competição.

E ai sim, poder guiar muito além dos 200 km/h em diversas categorias, como a Porsche Cup ou qualquer outra.

Bem melhor, não? E sem os episódios de acidentes fatais.

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Crédito das imagens: Divulgação/Porsche; Créditos ao Autor